PUB

Só faz bem a quem treina? Perguntas e respostas sobre a creatina

5 Jan 2024 - 09:04

Só faz bem a quem treina? Perguntas e respostas sobre a creatina

A creatina é um dos suplementos mais estudados e tem benefícios comprovados no contexto desportivo, como a manutenção da massa muscular e o aumento do rendimento. 

Contudo, além das vantagens no desempenho físico, defende-se online que este suplemento também melhora a capacidade cognitiva e até pode ser útil no tratamento de depressão e ansiedade. É verdade? O que se sabe sobre o efeito da suplementação de creatina na saúde? Quais os seus potenciais benefícios?

PUB

Em declarações ao Viral, João Palha, psiquiatra e diretor clínico da Casa de Saúde Santa Catarina (CSSC), Filipe Palavra, neurologista no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) e vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Neurologia (SPN), e o nutricionista Ricardo Cotovio, esclarecem o que se sabe sobre a creatina e o que falta saber.

O que é a creatina? Em que circunstâncias costuma ser tomada?

creatina desporto

Ricardo Cotovio começa por explicar que “a creatina é um composto orgânico” que pode ser obtida de duas formas. Por um lado, “é produzida no nosso corpo – no fígado, e, em menor quantidade, nos rins e pâncreas – a partir de três aminoácidos: a arginina, a glicina e a metionina”.

Além disso, também é possível obter creatina através da alimentação, encontrando-se, sobretudo, “na carne e no peixe”.

Segundo o nutricionista, a evidência robusta sobre a creatina centra-se nos benefícios da suplementação em determinados contextos desportivos. “A creatina está muito associada ao aumento de força e de potência em desportos de resistência e de explosão”, salienta.

Alguns exemplos de práticas em que se pode verificar “a ação positiva deste composto orgânico” são: “o trabalho de ginásio”, “a natação” e “modalidades intermitentes como o futebol, o voleibol e o basquetebol”.

Para mais, neste contexto, “também parece haver benefícios ao nível do aumento da massa muscular através da suplementação” de creatina, acrescenta.

Apesar de haver menos evidência nesse âmbito, a toma de creatina parece também “reduzir a fadiga mental em alguns cenários, sobretudo em situações de grande stress, nomeadamente de privação de sono ou na prática de exercício físico até à exaustão”, conclui.

PUB

Suplementação de creatina tem um efeito positivo nos idosos?

creatina idosos

Sim. Em declarações anteriores ao Viral, a nutricionista Catarina Custódio referia que, fora do contexto desportivo, a creatina pode ser benéfica “nas pessoas idosas nas quais se observa um declínio da massa muscular”.

Este “benefício marcado” nos idosos deve-se ao facto de haver “uma maior degradação e uma menor capacidade de sintetizar a creatina, em virtude do avanço da idade”, completa Ricardo Cotovio. 

Tomar creatina ajuda no tratamento da depressão e da ansiedade?

creatina depressão

A resposta é: ainda não se sabe ao certo. O psiquiatra João Palha admite que alguns suplementos alimentares são cada vez mais estudados e usados em contexto de depressão e ansiedade.

Percebeu-se, por exemplo, que alguns produtos compostos por ómega-3, magnésio, vitaminas e ácido fólico potenciam a “ação dos antidepressivos”, devido ao seu “mecanismo antioxidante” e “função neuroprotetora”, aponta o médico.

No que diz respeito à creatina, em teoria, este composto orgânico “tem algumas funções, sobretudo antioxidantes, com uma ação neuroprotetora”, refere. 

Além disso, também parece haver alguma influência “na mitocôndria” [central energética da célula] e na “sua recuperação funcional, nomeadamente na questão do stresse crónico”.


Ainda assim, apesar de a creatina “ter potencial” num cenário de depressão ou ansiedade, ainda são necessárias mais investigações. Segundo o psiquiatra, “há alguns estudos com bons resultados, mas são poucos e têm que ser replicados”. 

Havendo ainda apenas “estudos iniciais, com poucos doentes e pouco cruzados entre vários grupos”, surge também a questão da “dose”. Na perspetiva de João Palha, falta saber, entre outras coisas, “qual é a dose ideal e segura” e que pacientes podem tomar este suplemento.

PUB

Quando é que a toma de creatina pode ser benéfica para o cérebro?

pó de creatina

O neurologista Filipe Palavra começa por explicar que “o cérebro é um órgão cuja demanda energética é muito grande (tal como o músculo), daí que se tenha sempre considerado a creatina – um produto endógeno, que resulta do metabolismo de três aminoácidos”.

De modo geral, o cérebro vai buscar à creatina, essencialmente, “a fosfocreatina”, ou seja, “a pressão fosforilada desse composto orgânico”. Porquê? Sendo “uma fonte de energia”, a creatina “pode ser importante para o metabolismo cerebral”, justifica o especialista. 

Por um lado, se tivermos em conta a suplementação de creatina em pessoas com uma boa saúde cerebral, apesar de ainda não existir um consenso, há alguma evidência “relativamente à possibilidade de se ter algum benefício em termos de memória de curto prazo e de velocidade de processamento”, expõe Filipe Palavra.

No mesmo sentido, Ricardo Cotovio refere que os estudos apontam até para um benefício acrescido “em pessoas que tenham, de base, baixos níveis de creatina”, como indivíduos que “não consomem carne nem peixe”, por exemplo.

Noutro plano, “existem doenças hereditárias do metabolismo da creatina, que causam atraso de desenvolvimento, crises epiléticas e, eventualmente, uma perturbação do espectro do autismo”. Portanto, reforça, “o défice da creatina cerebral é uma doença neurológica” (ver aqui e aqui).


Mas é importante perceber de onde vem esse défice. Por que razão? Esse défice pode resultar “de uma falha na biossíntese da creatina – se não estiverem a ser produzidas as enzimas responsáveis” por esse fenómeno -, ou “de uma falha no transportador da creatina no cérebro”, esclarece.


PUB

Na visão de Filipe Palavra, “se o défice for da síntese, faz sentido suplementar”. Isto porque, como “o organismo não produz, fornecemos creatina e o cérebro passa a funcionar”, sustenta o médico.

Contudo, “se o défice for do transportador”, não serve de nada tomar creatina. Como esclarece o neurologista, este composto orgânico “não entra para o neurónio, porque falta a proteína necessária para fazer esse transporte”.
No fundo, clarifica, “está-se a dar combustível a um carro que não tem motor”.


No caso da demência verifica-se algo semelhante. A suplementação de creatina não tem efeito “numa doença neurodegenerativa, porque não há como aproveitar a creatina que estamos a fornecer”, já que, “na demência, os neurónios não estão lá”, sustenta.


Categorias:

Alimentação | Suplementos

Etiquetas:

Creatina | Suplementos | Treino

5 Jan 2024 - 09:04

Partilhar:

PUB